A noite era fria e calma. Nada se ouvia além do bater das ondas no rochedo, uma melodia triste e ritmada. Nenhuma gaivota, nenhuma cigarra e nenhum crustáceo se atrevia a interromper a canção hipnótica. Cada pedaço de vida na praia se calava para embeber-se do som, e observar a moça de longos cabelos e expressão sombria no alto do rochedo.
Seus olhos brilhavam como dois faróis na penumbra. Ela contemplava o mar. Olhava-o com febril adoração, como um crente a seu deus. Enfim, ela o encontrara; não tinha mais medo do depois, ou do que haveria à sua espera, se é que haveria. Toda angústia, todas as perguntas e toda decepção não mais existiam. Não ali, sob o teto de água.
A moça fechou os olhos aliviada. Estendeu os braços, saudando o mar, adorando seu deus, tão acolhedor, tão piedoso... O mar a chamava; dentro dele, todas as respostas. Ela sabia disso. Angústia, perguntas e decepção, nada mais importava. Rindo, a jovem moça desatou a correr em direção à beira do rochedo, os olhos fechados, os cabelos e o pesado vestido dançando ao sabor do vento... Até que os pés perderam o chão, e seu corpo era como a mais bela gaivota, indo ao encontro das ondas. Livre como nunca antes. Livre de si mesma.
Quando tornou a abrir os olhos, viu maravilhas com as quais jamais sonhara. Seres fantásticos e cores e luzes moviam-se ao seu redor. Minutos, meses, anos se passaram. Não sentia necessidade de comer, pensar ou rezar. Quando o último sopro de ar deixou seus pulmões, quando toda ela era feita de mar, a mão enorme e viscosa vinda do profundo veio de encontro à sua. Ela estendeu os dedos murchos de sal, agradecida. Encontrara sua paz. Então, deixou de existir.
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