domingo, 19 de junho de 2016

No divã

"Já se sentiu como se estivesse lavando uma louça muito suja, com a serenidade de quem sabe que o ralo estará lá para barrar os restos de passarem pelo cano e, ao lavar o último garfo, nota que o ralo tinha sido deslocado pela força da água e todos aqueles pedaços simplesmente desceram esgoto abaixo?"

"Ahn..."

"Tá, pensa numa chinchila que nasceu e cresceu dentro de uma daquelas gaiolas com grades de metal e foi solta no jardim pela primeira vez. Assim que ela encosta as patinhas na grama, percebe que não era nada daquilo que ela imaginava e tudo que ela quer é voltar pra gaiola, mas a humana que a soltou está toda satisfeita por pensar que os guinchos desesperados da chinchila são expressão da alegria de estar, pelo menos na concepção dela, livre... Entende?"

"Mais ou menos... Você seria a chinchila, a humana ou a gaiola?"

"Olha, é assim: eu olho pra uma daquelas garrafinhas de água de 500 mL sacudindo no bolso de uma mochila, sendo transportada pra algum lugar que ela não faz ideia e cuja única função é tranquilizar a consciência de um cara qualquer, já que no lugar onde ele vai existem muitos bebedouros e ele dificilmente precisará recorrer à garrafa. Eu a olho e me sinto exatamente como ela. Entendeu?"

"Entendi... Mas o que você sente?"